October 01, 2008
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Especialista analisa os avanços em transplante de endotélio

Cirurgião explica o procedimento básico do transplante de endotélio, divide os resultados de seus pacientes.

Durante os muitos anos que nos dedicamos à arte do transplante de córnea, fomos testemunhas de mudanças que melhoraram o prognóstico da ceratoplastia penetrante. Nos últimos tempos, mudanças mais profundas apareceram e foram sistematizadas, alterando substancialmente as indicações destes procedimentos.

Estas mudanças estão representadas pela tendência mundial de substituir a parte enferma da córnea, preservando as estruturas sadias da córnea do paciente.

Os enxertos lamelares profundos difundiram-se, sobretudo nos casos de ceratocone, com preservação do endotélio do paciente. Também estabeleceu-se o o transplante de endotélio, quando este se encontrar doente, sobretudo na ceratopatia bolhosa pseudofácica e na distrofia de Fuchs.

Transplante seletivo

Dr. Carlos Argento
Carlos Argento

Foram muitos que, como Gerrit Melles, Mark Terry, Francis Price, Mark Gorovoy, Máximo Busin dentre outros, contribuíram para o desenvolvimento desta técnica e ela é uma combinação dessas contribuições. Apesar de existirem algumas diferenças, os passos fundamentais estão consolidados e incorporados a este procedimento, que nos últimos anos foi convertido em padrão ouro .

Os nomes dos procedimentos: DSEK (descemet stripping endothelial keratoplasty), DSAEK (descemet stripping automated endothelial keratoplasty) e keratoplastia endotelial.

Estes termos são sinônimos e se referem à técnica atual que, basicamente, consiste em:

Preparação do enxerto doador: Extrai-se o enxerto de forma automatizada com um microcerátomo, em câmara artificial, cortando a parte superficial, deixando aproximadamente 150 micra de estroma e o endotélio. É a parte a ser implantada.

Extração do endotélio enfermo: Extrai-se com o método de “stripping”, ou seja, desnuda-se a córnea de seu endotélio enfermo, retirado junto com a membrana de Descemet.

Vantagens fundamentais

A câmara quase ocluída minimiza a possibilidade de complicações no momento em que o globo ocular está aberto, tal como hemorragia expulsiva.

Recuperação muito mais rápida. Como não há necessidade de suturas, a refração se estabiliza de forma mais rápida. Em geral, na semana 6, a maioria dos pacientes está com 20/40 de visão.

Existe uma pequena possibilidade de rejeição. Ainda que a rejeição seja possível, a maioria dos artigos indicam que a rejeição epitelial e também a endotelial teriam uma prevalência menor.

Desvantagens do procedimento:

A principal desvantagem é a curva de aprendizado. Nem sempre é fácil conseguir o tecido doador e uma dificuldade ou complicação pode levar ao desperdício do mesmo.

Outro potencial problema, muito importante, é a perda endotelial intra-operatória, derivada da manipulação ou do deslocamento do botão corneano, que obriga a reposição. Isto também está diretamente ligado à curva de aprendizado.

Variações da técnica básica

Na técnica moderna usa-se o microcerátomo para a obtenção do material doador (Dr. Gorovoy), muito mais preciso que a dissecção manual.

Em geral a espessura do enxerto deve ser de 150 micra e a placa mais freqüentemente usada é a de 300 micra. No entanto, em córneas doadoras de mais de 570 micra, deve-se usar uma placa de 350 micra e paquimetria intra-operatória. Com relação ao tamnaho, na maioria das vezes utilizamos 8,75mm, porém, se a córnea receptora for maior, utilizamos 9,00mm.

Injeção de ar
Injeção de ar.

Realização das incisões de drenagem
Realização das incisões de drenagem.

Imagens: Argento C

Preparo do paciente:

O desnudamento do endotélio é um passo fundamental nesta técnica. São dois os passos fundamentais. Primeiramente o “scored”, que é a marcação com um instrumento rombo e logo seguido do “stripping”, feito com um instrumento desenhado para tal fim.

Este pode ser feito sob soro ou viscoelástico, sendo mais sensível com viscoelástico. No entanto, deve-se ter a precaução de retirar completamente o mesmo, pois ele pode permanecer aderido ao estroma ou na câmara anterior, dificultando a aderência do enxerto.

A seguir, uma incisão escleral ou corneana é realizada. A incisão corneana tem a desvantagem do astigmatismo gerado pela sutura ser maior, no entanto tem a vantagem de não sangrar. .

Uma incisão de 4.5 a 5mm é preferida, pelo menos inicialmente, para reduzir o trauma do enxerto durante sua inserção.

O ‘taco’

Uma vez obtido o enxerto, coloca-se uma gota de viscoelástico no lado endotelial do enxerto e se dobra 60-40, deixando a parte 60% para cima, para facilitar o desdobramento com o ar. O “taco” assim formado deverá ser seguro com uma pinça que não traumatize a parte central e que só enconste na periferia, introduzindo com delicadeza na câmara anterior.

Injeção de ar

Este é um passo fundamental. Deve-se injetar ar lentamente sob a parte dobrada a 60%, para permitir que o enxerto se desdobre suavemente.

Uma vez que o ar tenha preenchido a câmara anterior, deve-se deixar por pelo menos 20 minutos. Logo após deve-se retirar uma quantidade suficiente para evitar bloqueio pupilar.

Incisões de drenagem

Dr. Price descreveu a realização de incisões na córnea, para permitir que o líquido aprisionado na interface saia. São realizadas com um diamante, seguido de massagem na córnea, para facilitar a saída do líquido.

Para evitar o deslocamento do botão, que é uma complicação desta operação, alguns autores, como Dr. Terry, realizam manobras durante o “stripping”, deixando rugosa a superfície periférica do receptor.

É de extrema importância que, ao terminar a cirurgia, o globo ocular esteja com pressão suficiente. A hipotonia é uma situação que favorece o deslocamento do botão doador.

Resultados

A maioria dos autores (Drs. Ferry, Price, Gorovov) relata resultados visuais muito bons. A acuidade visual nem sempre é excelente, mas em muitos casos fica em torno de 20/30 ou 20/25. A causa da acuidade visual não ser excelente, pode ser devido à reflexão da luz na interface ou alterações estromais devido ao edema crônico. De qualquer modo, a acuidade visual pós-operatória melhora com o refinamento da técnica.

O grau de deslocamento após acurva de aprendizado é, para a maioria dos autores, de 5% e a perda endotelial é ao redor de 20 a 30%, parecida com a perda que ocorre na ceratoplastia penetrante.

Nossa experiência pessoal foi muito boa, mesmo tendo duas complicações importantes em nossos primeiros 10 casos. Em um paciente foi necessário trocar o botão cornenano por edema persistente. O resultado final foi muito bom. No outro realizamos incisão escleral e houve sangramento para o interior da câmara, por não realizar boa hemostasia este enxerto se opacificou e perdemos o seguimento do paciente.

Não tivemos deslocamento de botão nos dez primeiro pacientes. E em todos os demais casos as córneas recuperaram sua transparência.

Estamos avaliando a perda endotelial neste 10 casos.

Para maiores informações:
  • Dr. Carlos Argento pode ser contactado à Universidad de Buenos Aires, Instituto de la Vision, Marcelo T. De Alvear 226, Capital Federal, 1122 Buenos Aires, Argentina; +54-11-4-827-7900; fax: +54-11-4-822-8374; e-mail: argento@impsat1.com.