January 03, 2005
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Avaliando a viabilidade econômica de novos equipamentos

Oftalmologista brasileira avalia como melhor administrar seu capital na medida que sua clínica cresce.

As mudanças sofridas na relação do capital com o trabalho nas últimas duas décadas têm influenciado a maneira que os profissionais de saúde em todas as áreas da medicina operam. Pequenas clínicas oftalmológicas que funcionavam com apenas uma secretária em um pequeno espaço físico objetivando basicamente refração e correção de ametropias experimentaram grandes mudanças.

Além de medicina tradicional, estes profissionais foram obrigados a aprender ferramentas de informática e tecnologia avançada para lidar com estas incríveis máquinas médicas que chegam ao mercado com uma rapidez cada vez maior.

Dra. Edna Motta Almodin [photo]O estudo de viabilidade descrito abaixo pode servir de referência para médicos que desejem ou que tenham recentemente adquirido um novo equipamento e não conhecem as implicações financeiras de sua decisão.

Pequenos consultórios crescem invariavelmente a clínicas e, em alguns casos, a pequenos hospitais com serviços multidisciplinares. Este crescimento também revela a necessidade de um novo entendimento em termos de administração financeira.

Os doutores têm agora que obter conhecimento a respeito de questões financeiras como depreciação de material, financiamento, preço de venda, retorno do capital investido e outras.

Os avanços tecnológicos na oftalmologia significam que as clínicas e serviços especializados devem ser constantemente atualizados e melhorados.

O estudo de viabilidade descrito abaixo pode servir de referência para médicos que desejem ou que tenham recentemente adquirido um novo equipamento e não conhecem as implicações financeiras de sua decisão. Os valores estão descritos na moeda corrente brasileira, real (R$).

Identificação do problema

Nosso serviço têm uma antiga tradição de dedicação à cirurgia de segmento anterior. As cirurgias de catarata são, naturalmente os mais comuns. Apesar do fato de nós já oferecermos algumas das tecnologias mais inovadoras, nós temos nos deparado com alguns resultados insatisfatórios inerentes a qualificação profissional ou limitações da tecnologia cirúrgica presente. Em uma avaliação recente, concluímos que alguns dos resultados eram relacionados ao fato de a cirurgia ter sido realizada em córneas com população endotelial deficitária, ocasionando descompensação e consequente insatisfação dos pacientes.

Numa tentativa de minimizar estes resultados, adquirimos um microscópio especular, o que nos permite avaliar a população celular e anormalidades no endotélio. Nossa expectativa era de que tal investimento nos traria mais eficiência e confiança em nossos resultados cirúrgicos. Ele também aumentaria o nível de satisfação de nossos clientes, o que refletiria diretamente na credibilidade do nosso serviço e nos levaria a um aumento do número de procedimentos.

Uma vez que o problema estava identificado e analisado sob ponto de vista clínico, partimos para a busca de uma solução que satisfizesse os pacientes e a clínica. Procuamos pelo mercado e encontramos um equipamento que apresentava um real potencial de resolver nosso problema. Entretato, nós necessitávamos saber se a decisão de se adquirir este equipamento era financeiramente atraente. Este é o ponto onde muitos doutores estão perdidos e em muitas circunstâncias tomam a pior decisào baseado em pouca informação.

O microscópio especular foi adquirido por R$60.000. Num primeiro momento, nós não sabíamos se tínhamos feito um bom investimento, apesar dos resultados obtidos com os exames. Decidimos fazer um estudo de viabilidade econômica do equipamento baseado em dados colhidos durante os primeiros meses de uso do equipamento. Era um estudo prospectivo e especulativo que nos traria resultados possívelmente após o primeiro ano de implantação do serviço.

Cálculo dos custos

O cálculo dos custos fixos de nossa clínica foi baseado nos cálculos de área em metros quadrados de espaço ocupada pelo equipamento. A clínica está localizada em um edifício próprio de 4 anos, com 600 metros quadrados e avaliada por dois corretores independentes desta cidade em R$300.000. Os custos fixos da clínica incluem depreciação, manutenção, folha de empregados, utilidades, lavanderia, seguros e outros ítens. Observamos que os nossos custos fixos eram de R$133 mensais.

Avaliação similar para os equipamentos revelou um valor de R$875 mensais.

O custo líquido por paciente foi calculado utilizando-se os custos fixos da clínica relacionados ao número de exames realizados mensalmente. Nosso custo líquido por paciente era de R$31,76.

Preço de venda

Após análise de nossa clientela e do mercado onde estamos inseridos, decidimos criar um pacote pré-operatório a ser oferecido aos pacientes. O pacote incluía biometria ultrassônica, ultrassonografia, topografia, mapeamento de retina e microscopia celular, somente para os pacientes da clínica. Este pacote tinha um preço de venda de R$350. Para se chegar a este resultado, consideramos uma margem de lucro de 50% nos exames, o que nos levou a um resultado de R$78.

Nós decidimos que um preço de R$150 por uma microscopia especular quando realizada sem outros exames associados especialmente para pecientes externos seria justo neste caso a margem de lucro aumenta para quase 70%.

Desta forma analisando os primeiros 2 meses de aquisição do aparelho chegaríamos a resultados como os descritos na tabela 1.

Tabela 1
Tabela 2

Cáculos prospectivos

Nossos cálculos prospectivos e especulativos foram baseados em resultados da operação do equipamento por 2 meses de forma a se obter dados para uma idéia da margem de lucro, turnover e retorno do investimento. Nos primeiros 2 meses conduzimos uma série de 74 exames, dos quais 48 eram pacientes da clínica e 26 externos. A renda gerada pelos exames realizados em pacientes da própria clínica era de R$3.744 e com uma margem de lucro de 50% chegaríamos à uma renda líquida de R$1.872,00. A renda gerada por pacientes externos era R$3.600 e com a margem de lucro de 70% chegaríamos a um valor líquido de R$2.730 (veja tabela 2).

Com o retorno do investimento calculado pelo lucro (R$27.612) dividido pelo investimento inicial (R$60.000), projetamos um retorno de investimento de 46% e um turnover de 27%.

Nosso ponto de equilíbrio para pacientes cirúrgicos seria de 23,5 exames por mês. Para pacientes externos seria de 9,2 pacientes por mês.

O capital investido inicialmente foi de R$60.000 com uma depreciação planejada em 7 anos. Os dados obtidos foram baseados nos primeiros 2 meses de uso e para uma projeção especulativa de 1 ano foi realizada (veja tabela 3).

Nos cálculos da tabela 4, observamos que o microscópio especular é factível a um preço satisfatório. No nosso caso específico, esta aquisição não gerou custos adicionais já que o espaço físico ocupado pelo equipamento não estava em uso e os membros do staff responsáveis pelo equipamento já possuíam alguma experiência e tempo livre para dedicação. Apesar disso, o cálculo do custo final incluía o espaço físico ocupado pelo equipamento e todos os gastos resultantes de material e trabalho assim como manutenção.

É importante observarmos que nossa clínica trabalha exclusivamente com pacientes privados, sem qualquer tipo de acordo com operadoras e planos de saúde. Analisando os dados, notamos que a aquisicão do equipamento é, de fato, factível e segura. Na análise dos 2 primeiros meses, utilizamos a estrutura que já tínhamos, sem qualquer tipo de marketing ou propaganda para a nossa clientela. A ampla margem de lucro nos permite ter alguma segurança que que numa eventual necessidade haja possibilidade de aumento em nossos custos. O retorno do investimento é bastante promissor, sinalizando um possível retorno do capital aplicado em aproximadamente 3 anos. Além dos ganhos diretos dos exames, observamos um incremento de 10% do nosso volume cirúrgico de cirurgia de catarata durante estes 2 meses, o que nos leva a acreditar que isso seria uma consequência de uma segurança extra e da diferenciacão oferecida a nossos pacientes.

Mesmo que o mercado se torne desfavorável nos próximos anos e tenhamos que trabalhar com convênios e operadoras de saúde para manter nossa renda, ainda estaríamos em uma posição confortável uma vez que temos um custo extremamente reduzido que nos dá uma boa margem de negociação.

Entretanto, este nível confortável somente se torna possível quando os médicos têm um total entendimento das implicações financeiras de suas decisões. Médicos naturalmente não recebem treinamento administrativo-financeiro, uma ausência que pode causar sérios danos à nossa profissão. No fim das contas, está claro que isto é uma questão de sobrevivência e que nós deveríamos estar nos unindo mais e mais a fim de dividir nossas experiências e tentar identificar as armadilhas preparadas e as necessidades para um futuro breve e mais seguro.

Por ser este um artigo de jornal, muitos cálculos específicos foram omitidos em prol de objetividade. Por favor, entre em contato para casos mais específicos na utilização destes cálculos em sua prática.

Tabela 3
Tabela 4

Para sua informação:
  • Dra. Edna Motta Almodin pode ser contatada na Provisão Hospital Olhos de Maringa, CEP 87 013 010, Maringa, Parana, Brasil; +55-44-262-2061; fax: +55-44-225-1162; e-mail: almodin@irapida.com.br.
Referências:
  • Diaz-Valle D, Benitez del Castillo Sanchez JM, et al. Endothelial damage with cataract surgery techniques. J Cataract Refract Surg. 1998;24(7):951-955.
  • Bourne WM. Specular microscopy of human corneal endothelium in vivo. Am J Ophthalmol. 1986;81(3):319-323.
  • Nakagawa M. Gestão estratégica de custos: conceitos, sistemas e implantação. Editora Atlas, São Paulo, 1991.
  • Falk JA. Gestão de custos para hospitais: Conceitos, metodologias e aplicações. Editora Atlas, São Paulo, 2001.